domingo, 20 de abril de 2014

Forca

Já era invejante o grave câncer - patologias lúdicas já haviam lhe empanturrado. Até quando aguentaria o dia próximo, esses amanhãs involuídos a ontem?
O corpo em perfeito funcionamento - exames vários esfregavam-lhe na fuça; as viagens fartas em quilômetros e riscos de cujas saía intacto geravam amiudadas decepções.
O sentimento de inadequação terrena corroía, mas só a alma. Se a doença do espírito não se esparrama pelo corpo, de nada serve.
Já era claro que não haveria um fim, o cabal, sem agir - mas coragem de protagonizá-lo ativamente não possuía.
Talvez, bêbado e drogado alcançaria essa impavidez - mas nessas horas a vontade era de viver, de não dormir: procrastinar o sono que acabaria com a felicidade química, a única possível.
Suicídio não era compatível com esses momentos.
Resignou-se: viveria muito. Só porque não queria.
E ao fim, décadas vividas compulsoriamente - beirando o sonhado êxodo, percebeu que morto sempre foi.
Sorriu.






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