segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Diário de um bipolar

Acordo, levanto e taco meu cadáver nas costas para andar por aí. Por mais que sejam discretos e paulatinos, percebo o chegar de meus limites. Saio a trabalhar com correntes amarradas nas canelas, arrasto-as por longas horas até chegar a tão querida hora de deitar de novo. Nunca só, a solidão é uma companheira muito fiel.
Amanheceu, dei “bom-dia” para os pardais que com suas sinfonias me acordaram, fiz o mesmo com o Sol. Peguei meus fones de ouvido, vesti meu tênis mais macio e sai pra correr numa espécie de louvor à vida. Alimentei meu corpo com carinho e respeito, banhei-me em água morna para relaxá-lo e ensaboei-me cantarolando a mesma música dos pardais matutinos.
Acordo, levanto e taco meu cadáver nas costas...

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Eu me declaro culpado.

Culpo-me por muito do que faço, mas agradeço imensamente a Deus por ter feito.
Alguns sentimentos são intrínsecos à nossa natureza, esse é o caso da culpa. E com séculos de Cristianismo nos impondo restrições, dela não nos livraremos nunca.
Nossa alma é uma engrenagem de sentimentos, é incrível como uns necessitam de outros. Nosso egoísmo natural, aquele que nos mantém vivos (comer é um ato egoísta, por exemplo) poderia ser amplificado chegando à “psicopatia” caso não sentíssemos a nossa culpa original, a natural. Faço questão de frisar que falo de natureza; não de cultura e/ou costumes, debater valores morais é coisa de gente burra. Vivemos em sociedade, regras devem ser seguidas e blá, blá, blá; mas querer chegar à respostas sobre o que é certo ou errado é coisa de desocupados ou alienados. Me diga uma coisa: quantas vezes você não se deu mal tomando a decisão correta? Acho que agora você está começando a me entender.
Bom, digressão à parte, quero voltar àquela culpa de que falava no início do texto. É mais que óbvio que nossas experiências moldam o que nos envergonharemos de sentir, tratando-se de religião, por exemplo, o sexo é o pico da enfermidade moral. Não é preciso ser um “Nelson Rodrigues” para entender que naturalmente o sexo é baixo, vil e extremamente necessário. Essa conversa de sexo apenas para reprodução eu deixo para os criadores de ovinos. Sou muito a favor dos ensinamentos bíblicos, mas desde que sejam interpretados como metáforas que são. Assim eles visam o nosso bem estar corporal e espiritual; não nos restringir de prazeres. O prazer é outro sentimento ligado à culpa: a mesma culpa que se tem após o gozo é a que se tem após devorar um doce bem calórico. Acredito que esse tipo de culpa é anexa ao nosso ser original, independente de experiências externas.
De certa forma, a culpa é um anjo que nos acompanha o tempo todo. A culpa original, não a que parafusaram em nossas consciências.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Corra

Hoje, a querida e talentosa Renata Lopes perguntou-me num de nossos papos que já viraram frequentes no messenger se eu havia deixado a Música. Respondi que não.
Nesse mundo em que vivemos, o talento pode ser um Karma, uma chaga herdada não sei de onde ou mesmo um acidente como, às vezes acredito, o modo que deu-se a nossa origem. Devo dizer que estou especificamente falando sobre o talento artístico.
A arte como vocação intensa pode atrasar o que deveria ser feito em série, sem pensar. Estudar, por exemplo: quantos artistas abandonam os estudos ou pausam-nos por acreditar piamente em seu talento e, pior, nos louros que colheriam por conta do mesmo?
Nas raras vezes em que se é bem sucedido, passa-se a ter uma vida interessante e rica em idéias, mas não feliz, felicidade absoluta não existe, muito menos na alma de um artista, que é suprida por solidões e vazios corrosivos à qualquer pessoa “comum”.
Não sou contra a arte, sou contra o mundo, e o mundo, infelizmente, é muito maior que ela. Conheço homens de quarenta anos que vivem como zumbis por terem apostado todos os seus mais dinâmicos anos de vida em uma vida quase utópica, não saberia dizer em porcentagem o número de artistas que se realizam profissionalmente. Hoje, esses homens de quarenta (ou mais) não têm condições nem para o básico (“básico” de um artista é bem mais que o de praxe), têm a casa cheia de livros, mas não pagam a pensão de seus filhos há tempos; têm a cabeça cheia de idéias, mas não têm “rúpias” para pô-las em prática; têm um vasto conhecimento, mas tratados são feito “vagabundos”. Triste a vida de um artista que resolveu viver de sua arte. Hoje trabalho numa empresa de Escolta e Vigilância Armada, eu, que a única arma que empunhei a vida toda fora um piano. Uma miríade de livros, também. Frustrado? Nem um pouco!!!
Aliviado e tranqüilo por ter tido tempo de ter uma vida digna e dar o mesmo a meu filho.
É óbvio que nunca largarei as teclas e os sons maravilhosos que se formam quando essas são somadas às minha mãos, mas agora eu só toco por lazer ou por um dinheirinho a mais pra cerveja.
Conselho aos talentosos: mergulhem de cabeça nos estudos de sua arte, mas faça o mesmo com os estudos burocráticos que a vida medíocre exige.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Fenômeno

“Ele é milionário, vive na opulência e anda com belíssimas mulheres.”
Estou descrevendo a vida do fenomenal Ronaldo. Não por ser seu fã (e sou), mas por que quero falar sobre a crueldade da ingratidão e a vil efemeridade.
Apesar de tudo aquilo que de fato é verdade e foi dito na primeira frase desse texto, esse homem propôs-se a ir além de seus limites físicos e emocionais para viver o que mais gosta de fazer e o povo mais gosta de assistir, e assim o fez: mesmo depois de um longo histórico de lesões (graves, diga-se de passagem) e dores quase insuportáveis, ele (acho que no meio futebolístico deveria ser tratado como “Ele”) deu uma aula de humildade e resiliência, fazendo com que gente como eu, que não dá importância alguma a um jogo de bola (além do fato de ser um esporte), assistir emocionado à partidas inteiras. Sou fã incondicional do talento e da persistência não vã, e “Ele” sabia que vã não era.
O fato é que é da natureza de alguns imbecis o imediatismo e a mediocridade, e de imbecis forma-se a maior parte de “torcedores” organizados. Uma pessoa que mata por um motivo não pode torcer pelo mesmo. Esses não gostam de futebol, mas nem mesmo eles sabem disso. Ainda tive de assistir um repórter perguntando o porquê da falta de comprometimento do Ronaldo com a perda de peso. Risadas (irônicas). Ele respondeu como um cavalheiro cheio de razão: “Depois de oito cirurgias no meu corpo e dores muito fortes ainda tenho de ouvir gente como você falar de comprometimento.”
Não preciso escrever sobre o desprezo que tenho por esse jornalista.
Bom, mas vale dizer que a matéria final do “Globo Esporte” de hoje foi uma linda e justa homenagem a esse ídolo.
Queria entender como que pessoas que há pouquíssimo tempo atrás aplaudiam e choravam de emoção ao vê-lo brilhar em campo agora o crucificam e odeiam. Na verdade entendo: muita pobreza de alma, gente que se considera feliz e poderosa. A sua pobreza material não contrasta com sua pobreza espiritual, gerando assim uma falsa sensação de poder e felicidade.
Espero que esse ídolo saiba que nesse meio sempre existiu essa tal de ingratidão e a falta de memória, mas se ele ainda não souber, nós, os fãs do talento, o faremos lembrar.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Lixo Cultural

O mundo não pode acabar. Ele tem que acabar!
Não, não – não se trata de revolta, é apenas um pessimismo induzido pela alienação explícita na mídia, principalmente no Brasil, nessa época de Carnaval. Na minha última tarde de domingo, preparando-me para encarar algumas 15 horas de trabalho, eu estava estaticamente sentado em frente à televisão enquanto se passava aquele famoso “Domingão da Alienação”, apresentado por um cara nada alienado e que demonstra seu desprezo por temas fúteis, mas que, por ganhar muito dinheiro, está há um bom tempo no ar. Bom, não é novidade que a cada ano, nesse esquenta carnavalesco, aparecem músicas abomináveis executadas por cantores e/ou grupos bizarros, mas, confesso, dessa vez conseguiram superar minhas péssimas expectativas: “Reginho dos Teclados” foi demais, subestimei a falta de cultura da grande massa brasileira.
Trata-se de um “ser” horroroso cantando uma “música” sem melodia e sem graça (ele jura que é engraçada, divertida e dançante), e que é acompanhado por quatro placentas que devem ter sido criadas no lugar das crianças que devem ter sido jogadas fora.
Que coisa medonha... Quando o apresentador os entrevistou eu senti vergonha por eles, por mim, pelos deuses da nossa música, pelo meu país e por todo talento que o povo brasileiro desperdiça por falta de cultura.
Infelizmente, aqui no Brasil essas coisas são muito comuns, usamos a “alegria do povo brasileiro” como desculpa para a ignorância. É fácil explicar: o povo é pobre culturalmente, sendo assim não há contraste com a miséria interior, a miséria de alma.
Amo meu país, mas há coisas “sobrenaturais” (traduza como “bagunça”) que só mesmo aqui acontecem. Onde mais um goleiro faria 100 gols? Onde mais grande parte dos traficantes cheiram? Onde mais as prostitutas gozam?
Esse é meu país. Tem tudo, mas não tem nada. Um continente com potencial de primeiro mundo jogado às traças. Muito antes da “reforma agrária”, seria necessária (vital!) uma reforma educacional. Como um país de grande parte de professores burros irá crescer? Eu não deixaria meu filho nas mãos de um “mestre” que fosse fã do “Parangolé”. Bom, mas a maior parte é e eu não quero briga (mentira: quero, sim).
Acho que esse besteirol musical serve apenas para “fundinho” de porres providos de chifres e dores de corno em geral; aí faz-se uma merda grande que te deixará com péssimas lembranças e três acordes ressoando em sua cabeça.
Bom, se você pretende chutar o balde, vai aqui uma dica: Reginho!!!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Ter ou não ter...

Acho que uma matéria que deveria ser “obrigatória” numa grade escolar é administração de finanças pessoais, algo que ensinasse as crianças a lidarem com dinheiro. Não é inteligente não mostrar o valor que a “bufunfa” e a maneira como se administra têm em nossa vida prática. Desde cedo é preciso orientar os pequenos para que encarem e suportem essa selva capitalista em que vivemos. Acho muito bom um filho receber uma mesada, mas acho péssimo que os pais o socorram quando suas finanças entram em crise. É cedo que se aprende a se virar e, mais ainda, a trabalhar para resolver. Sei que é difícil não ceder aos olhares sedutores de um filho, mas é preciso ser austero. Na vida de uma criança, a mesada tem o mesmíssimo valor que o nosso suado salário, é preciso que os filhos saibam cuidar de suas economia o mais rápido possível. Quando digo que não devemos socorrer nossos amados gastadores não quero dizer que não possamos orientá-los, muito pelo contrário: devemos. O que não pode acontecer é dar mais do que já foi estipulado.
Acho muito importante presentear, mas é preciso que fique explícito que se trata de um “carinho” e que esse carinho é esporádico. É uma exceção. Podemos ensinar desde cedo um jeito de conseguir o que se quer (materialmente falando) com trabalho e/ou sacrifícios e restrições. E é muita hipocrisia dizer que queremos a felicidade de nossos filhos sem que importe o dinheiro. Muito da “felicidade” (traduza como “bons momentos”, felicidade não existe) é diretamente ligado a dinheiro: o nascer do Sol é gratuito, o brilho da Lua, também; mas bons carros, bons vinhos, boas viagens, boas escolas, bons planos médicos, muitas das belas mulheres e muitos outros itens custam caro, e bem caro! Portanto, assim como é importante ensinar o valores intrínsecos à alma com aulas de filosofia, psicologia, literatura, etc; é preciso ensinar valores práticos como controle de finanças.
Pense nisso: “Mais importa o “ser” do que o “ter”, mas, muitas vezes, para “ser” é preciso “ter”.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Desejo de alma e corpo

Enganam-se as mulheres que creem que o homem está sempre interessado em sexo. Pelo menos os pensantes não circundam apenas os interesses imigrados de estímulos hormonais. O interesse é a palavra chave numa relação homem-mulher (ou o misto de gêneros que lhe for de interesse), e, ao contrário do que querem alguns manipuladores (religiosos ou não), não devemos enxergar o interesse como “pecado”, trata-se de ferramenta básica de sobrevivência. Sempre estamos interessados em algo, às vezes nosso interesse é o bem estar do outro (começa entender do que falo?), portanto, por mais contrário que pareça, o interesse pode ser altruísta.
Bom, mas não quero aqui dar uma versão “desaureliana” de interesse, quero falar dos outros interesses que nós homens temos.
Muito nos interessa uma boa companhia, um bom papo, uma simples presença, e, pode acreditar, muitas vezes desprezamos o sexo. Não falo de ereção nem da falta de, mas falo de sentimentos, de idéias de companheirismo. Eu, bem particularmente, estou farto de sexo casual, quero paixão, quero tapas na cara.
É lógico que devemos excluir dessa teoria os “adolescentes”, que estão sempre dispostos a sexo desenfreado e utópico (eles imaginam muito mais do que vão ter em qualidade e quantidade), o que é biologicamente natural e fazem com que os banhos demorem mais um pouco.
Cá entre nós, não é muito melhor o sexo apaixonado, com beijos intensos na boca (e em muitos outros pontos), com pegadas possessivas e com certeza da presença da pessoa nos dias seguintes?
Se você não é um analfabeto de alma, sei que a resposta é positiva. Agora, se você é um imbecil, saiba que quero muito te incomodar.
Acredito que muitas das traições são frutos dessa cultura quantitativa sexual do homem, às vezes ele não percebe que é feliz (ou tem vergonha de ser) e pula a cerca sem vontade alguma (ou uma vontade que seria possível sentar e esperar passar) acabando com uma família. A traição é muito perigosa: de um bom sexo pode nascer uma paixão avassaladora, suja e que pode acabar com uma vida. O sexo, como qualquer prazer intenso e momentâneo, pode nos cegar e fazer com que tomemos atitudes instintivas, e pior: diretamente ligadas aos nossos genitais. Não sou hipócrita de condenar o “traidor”, à nós são intrínsecas miríades de sentimentos, além de que existem mulheres que pedem (assim como homens) por um belo par de berrantes. Não vou entrar naquela velha conversa de que “é melhor separar”, concordo, mas desde que seja “contextualizada”. Vou deixar essa discussão para os padres e os hippies.
Apesar de ter feito uma pequena digressão eu quero apenas deixar claro que não nos interessa vossas presenças apenas na cama. Queremos vocês por inteiro: com suas manias, chatices, neuras... Mas, também, com suas sensibilidade, carinho, afeto e, muito importante, com esse corpo delicioso.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Sangue

Acredito que afeto se conquiste com o convívio, algo do tipo “pai ou mãe é quem cria”, mas admito que laços sanguíneos são muito fortes.
Tenho sobrinhos que amo intensamente e me preocupam tanto quanto meu filho, apesar de pouco convívio presencial. A vida moderna nos aproxima virtualmente, mas pessoalmente nos distância cada vez mais. Meus sobrinhos não vivem o que eu e meus primos vivemos, eles não “crescem perto”, como dizem os mais velhos. Tive uma relação de irmãos com todos meus primos, juntávamos nós todos na casa de uma das tias ou ficávamos todos na “casa da vó”, isso nos mantém ligados até hoje, mesmo cada um já tendo sua própria vida e seus próprios ofícios. Mas é intrigante quando nos juntamos todos mais nossos filhos em comemorações de aniversários, nascimentos, viradas de ano, Natal, etc. Dá-me a impressão de que os pequenos moram juntos, o “fogo no rabo” impera e as panelinhas se formam em segundos. A timidez dura muito pouco (diferentemente de quando encontram crianças não agnadas) e a proteção mútua é perceptível. Não imaginem que eu vá explicar como isso ocorre, eu não faço a menor idéia. Só sei que acontece. Mas esses misteriosos laços trazem o infortúnio das perdas, nas horas tristes, todos sofrem. Ver um ente amado sofrer nos causa muita dor, assim como perder um deles. Em três dias vivemos a tristeza de perder o mais novo da geração dos “primos que cresceram juntos” e a alegria de receber o mais novo dessa nova geração de primos. E agora convivemos com esses dois sentimentos na mesma intensidade. Pena pro pequeno Caio a certeza de não conhecer o Leonardo. Quero lembrar que esse primo que nos deixou era “idolatrado” pelos pequenos.
Mas aqui quero falar de sangue, essa minha certeza sobre a força desses laços vai contra todo ceticismo que venho desenvolvendo às custas de muitas leituras filosóficas e outras nem tanto. Mas no fundo chego a coerência de perceber que estou certo: não somos nada e de nada sabemos.
Alguns filósofos afirmam que nos prendemos a esse amor de sangue (filhos, irmãos, primos) por falta de opção, que somos frustrados nas relações conjugais e por isso nos agarramos ao que nunca vai mudar. Eu concordo e discordo (é filosofia, eu posso fazer isso) em gênero, número e grau. Mesmo sendo um cético não posso fingir que não enxergo “forças” (acho brega dizer “forças”, “energias”, mas como não fazê-lo?) maiores do que tudo que compreendo, assim estarei sendo hipócrita e batendo de frente com tudo o que acredito. Complicado, não? É, mas não é; tem que ser, mas não pode ser...
Que bom que estou perdidinho.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

O Deus Acaso

Sou um cético: não acredito em bênçãos, em proteção divina, em amuletos ou carrancas, em orações e não acredito em rituais religiosos. Acredito em Deus, e é só. Depois da criação estamos à mercê do acaso ou de decisões que tomamos. Ou um ou outro, se bem que acho que tomamos decisões por acaso. É sabido que há uma guerra química em nosso cérebro antes de decidirmos algo, mas só os acontecimentos posteriores dirão se a decisão tomada foi a “correta”. Mais um ponto pro acaso.
Quanto às tragédias, por exemplo, alguns dirão que em situações de risco é mais fácil ocorrer algo trágico, é verdade. Mas o risco não significa uma tragédia iminente, você pode viver cem anos pondo sua vida em risco diariamente (falo de riscos práticos: beber e dirigir, saltar de para quedas, etc. Acordar já é um risco, eu sei) e uma pessoa pacata pode se estrepar cedo, cedo. Imagine uma pessoa comendo alguns “Bis”, agora imagine que ela deixou cinco na caixa, saiu na rua e foi atropelada por um caminhão. E se ela tivesse comido mais um? Você está entendendo onde quero chegar? É o acaso que dirige nossas vidas. Não sabemos de nada, mas não se culpe, não há nada a saber sobre a vida. Nós somos a vida e o que será dela.
Gostaria muito de acreditar em destino, assim não sentiria tantas culpas, mas eu sei que toda minha vida depende de sorte pra acertar em minhas decisões. A sorte é muito mais decisiva do que qualquer decisão.
Como eu queria rezar e sair de casa sabendo que nada de ruim vai me acontecer e nem a alguém que amo.
Desculpem-me o tom trágico desse texto, perdi um ente querido num acidente banal, só posso dizer que, por acaso, o 2011 de minha família começou muito mal.
Não vou culpar Deus, ele nos criou e nos deixou aqui pra nos virarmos. Não vou culpar o motorista que bebeu demais, muitos bebem demais e dirigem. Não vou culpar meu primo que entrou nesse carro, sempre fiz isso e sei que você também.
Vou apenas continuar chorando e tentar proteger meus entes queridos ao máximo, quem sabe assim não passo a perna no acaso?

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Anjo


Eu, meu irmão e meus dois primos carregamos o caixão do nosso primo mais novo. Ele era o mais generoso, mais inteligente e mais humilde,
Se existisse justiça, ele seria o último dessa geração a partir, mas sabemos que não existe justiça, injustiça, sentido, falta de sentido, bem ou mau. Depois da criação, o nosso deus é o acaso.
Vinham ele e mais três amigo de uma festa de casamento, uma coxinha a mais a comer ou um abraço de despedida a mais antes de entrarem no carro poderia mudar todo o final da história.
Até mesmo uma garrafa de cerveja a mais, essa mesma que acabou com todo o juízo e todo o reflexo desse desgraçado* motorista, poderia mudar esse enredo. Não procuremos explicação, não há.
O que quero aqui é dizer que meu primo nos fará muita falta, e que sofro muito em dois níveis: o primeiro é pela ausência permanente de um cara tão divertido e bom, e o segundo é por ver todos os que amo sofrerem essa mesma dor.
Não foi à toa que vieram tantos amigos de muito longe pra prestar a última homenagem com seu corpo presente, uma pessoa perfeita inevitavelmente é muito amada.
Sei que minha família vai se unir e proteger ainda mais, assim sinto um alívio: a morte desse anjo não será em vão.

*Leiam a tréplica.


Tréplica:

Rafael, também pela dor que o Luiz André, que nem conheço - mas sei do amor que ele e o Léo tinham um pelo outro, que digo no texto a palavra "desgraçado". Foi exatamente por sentir que ele não terá mais paz que eu disse que ele foi um "desgraçado". Não tenho nada contra ninguém. Muito pelo contrário, fico feliz de meu primo ter amigos tão ligados. O Léo os amava, sei disso. Muito se fala nesse amor nas nossas reuniões familiares pós acidente. Se uma pessoa que daria a vida por alguém que morreu não é "desprovido de graça", não mais sei quem seria. Pra você entender melhor: tenho certeza de que não há ninguém mais desprovida de graça do que minha tia Ruth nesse momento.


Lucas, não, não. Você me entendeu errado. Quando disse "desgraçado" quis dizer "infeliz", "desprovido de graça naquele instante", você não sabe, mas por conta de pré julgamentos de algumas pessoas defendi muito vcs três que estavam no carro. Ninguém é culpado. Releia e leve ao pé da letra o que escrevi e saiba que não estou com raiva. Só triste.

Adeus, primo.